A primeira delas foi a respeito do trabalho como forma de alienação do homem moderno ou pós-moderno. Alguns poucos séculos foram suficientes para que a capacidade de realização que o trabalhador possuía com o fruto do seu trabalho fosse destruída e substituída pela total impessoalidade do trabalho moderno. Os meios de produção em que vivemos atualmente simplesmente destituem o trabalhador daquilo que produz. Sua capacidade de ver-se no resultado do seu trabalho não mais existe e deu lugar apenas à alienação completa do ciclo produtivo.
O sistema capitalista tinha o princípio fundamental de permitir ao homem recém saído das agruras da Idade Média a possibilidade de liberdade à partir da utilização de seu corpo como uma máquina natural da melhor forma que lhe conviesse. Porém, com o aumento desmedido da concentração dos meios de produção nas mãos de poucos burgueses, esta relação tornou-se fortemente desfavorável ao trabalhador. A implementação do regime de salariato o impedia de achar alternativas ao novo sistema de consumo e produção ficando, dessa forma, impelido de forma compulsória às fábricas e à exploração de sua capacidade produtiva.
Com o desenrolar dessas atividades chegamos fatalmente às linhas de produção fordistas e aos padrões de consumo excessivamente desmedido da sociedade atual. O homem moderno tem uma forma estranhamente descabida de ver o mundo: sua vida resume-se em trabalhar hora a fio em um trabalho que não lhe pertence como igualmente não lhe pertencem os frutos desse trabalho. Não há realização pessoal nessas tarefas. Mas, como é da natureza humana, o homem sempre procura uma forma de permitir que seu espírito criador torne-se livre. Era o que acontecia com os escravos gregos, que de uma forma ou de outra realizavam algo onde pudessem libertar suas mentes, assim também acontecia com os servos medievais para permitir certa mobilidade criadora plantando ou fabricando algo. O homem moderno, no entanto, está em desvantagem em relação ao servo medieval e até mesmo com o escravo grego. Além de ter o resultado de seu trabalho expurgado de sua realidade as horas que lhe serviriam para projetar algo em que pudesse libertar sua mente da frustração do trabalho são fatalmente preenchidas por uma série de ideologias produzidas para que ele reproduza os padrões sociais necessários à continuidade da vida capitalista: o consumo.
Atualmente todos, sem exceção, eu ameaço afirmar, somos tomados pela volúpia do consumismo irreal, pela necessidade de valorizar o ter, atribuir valor ao inanimado e a desvalorizar a pessoa humana.A cada dia, a cada conversa, a cada compra que fazemos, a cada dia de trabalho, enfim a todo o momento estamos mutuamente nos embebedando das ideologias que nos impõem. E, ainda pior, reproduzimos cada uma delas como se disse dependesse nossa sobrevivência. É impressionante como não nos culpamos, como não nos responsabilizamos, como somos descrentes e usamos do descaso quando vemos alguém passando por privações desumanas seja de alimento, teto, roupas, dignidade, compreensão. Estamos como cegos para a realidade, distantes do mundo real e envoltos numa áurea virtual.
É certo que a grande, esmagadora maioria da humanidade não tem a mínima condição atualmente de questionar tais pontos. E isso se dá pois o próprio processo de alienação do trabalho se alastra pelas outras instâncias da vida e se manifesta na falta de reflexão sobre como os processos de aprisionamento ideológico se dão.
Mas o mais estarrecedor não é constatar que essa grande massa de seres humanos humilhados pelas ideologias e pela descrença mútua de seus consortes esteja alheia à todos esses complexos níveis de cárcere.
O mais estarrecedor é saber que aqueles que possuem certa capacidade de abstrair essas questões, que têm a possibilidade de interpretar, entender e julgar o porquê de tantas injustiças, distorções e misérias no nosso planeta, não são capazes de agir. A acomodação e a resignação dos que podem fazer alguma coisa também faz parte do julgo da alienação em que vivemos. Acreditar que o mundo é como está e que não há como mudar é abster-se da responsabilidade de mudança e, pior, conformar-se com as coisas como estão. Se um dia a força dos bons acabar entraremos definitivamente no império dos maus.
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